O OVO DE OURO*
Certo casal de
portugueses foi ao mercado europeu comprar uma galinha poedeira de raça.
Aparentemente um galináceo igual a tantas outras galinhas de banal raça porque era dotada de bico, penas, pés tendo aquele jeito meio bobalhão de andar à cata de minhocas.
Pela matina seguinte quando a mulher foi ao galinheiro recolher os ovos,
apanhou um grande susto, assim se dando inicio a esta fabulástica estória que vos envolverá até ao final das vossas vidas, caso não migrardes para parte incerta!
No ninheiro a sortuda camponesa encontrara um ovo como até então nunca houvera visto!
Um fantástico ovo... em
ouro!
Não havia ali qualquer parentesco com o galo de Barcelos!
Poderia ter achado uma apetitosa cenoura de Nantes para encher o ôlho ou uma couve de Bruxelas para encher as algibeiras... mas não!
Tinha que ser exactamente... um ovo de ouro!
A mulher pegou no ovo com a mão direita, cheirou-o, lambeu-o, examinou-o detalhadamente... não lhe restando quaisquer dúvidas... aquele ovo era mesmo de ouro puro!
Cobrindo-o com um pano velho para que a vizinhança não o topasse, saiu correndo da capoeira, indo contar a boa nova ao marido que dormia tão sossegado...
- Acorda! Olha o que eu encontrei no ninheiro da galinha que
comprámos ontem no mercado europeu!!!.
Estremunhado, o homem olhou o ovo dourado, pegando-o,
medindo-o, lambendo-o, pesando-o e por fim soltando um grito que se ouviu a sete léguas de distância, exclamou para a mulher:
"dois likes
para o povo"
- Mulher, esse ovo é de ouro puro! Estamos ricos!
Perante a evidência do facto, a mulher foi alvitrando:
- Estás a ver como foi bom irmos às compras ao mercado europeu? Com um único ovo posto por esta galinha ficámos imediatamente ricos! Imagina
como ficaremos com o resto dos ovos que esta poedeira traz na barriga. Vamos
esventrá-la para lhe retiramos os restantes ovos e as moelas e com o dinheiro
da venda do ouro compraremos um palácio, um automóvel topo de gama, sairemos à noite e passaremos as próximas férias viajando pelo mundo fora!
-Tem
calma mulher. Primeiro vamos aguardar que a nossa galinha ponha mais ovos!
Assim foi. Para além deste, de cinco em cinco anos a galinha pôs mais outros dois ovos de ouro e entrementes o casal, cego de ambição, não desperdiçou meças no tempo!
Como aquilo estava a dar e esperançados com os ovos no cú da galinha, os camponeses mandaram construir um
palácio, compraram dois bólides topo de gama ostentando o simbolo da forquilha...
...saíram à noite para festas de arromba, alistaram-se em todos os concertos de verão que havia na época e, por terra, mar e ar, calcorrearam terras da cochichina, partindo à descoberta de ociosos mundos!
E à velha galinha que jamais voltou a pôr outro ovo... foi-lhe destinado o dia do juízo final em que na esperança de lhe extrair as moelas e mais ovos de ouro, o homem correu até à
cozinha, munindo-se dum luminescente facalhão com que sofregamente decapitou, decepou, estraçalhou e esventrou a desgraçada poedeira...
Aberto o corpo da bichana, foi enorme a decepção, pois dentro da galinha o casal só
encontrou caca e tudo o demais que é normal acharmos dentro de qualquer raça de galinha.
Tripas, coração, moelas, fígado, rins e muito, mesmo muito sangue que sobrou para uma óptima cabidela...
O terceiro ovo de ouro que ainda guardavam e era tão oco e estéril quanto os seus dois irmãos, vencidos cinco anos tiveram que o entregar à Troika,
uma loja internacional de penhores, acabando os camponeses por ficar mais pobres que dantes, deixando de terem poder de compra e trocando acusações, passaram o resto da vida fazendo ginásticas financeiras na tentativa de liquidar as dívidas e os juros da miragem europeia...
- Ó mulher! Se ficámos mais pobres foi por tua causa.
- Não, a culpa é tua, hóme da minh'alma, que não tiveste paciência.
- Minha?! Não! A culpa é toda tua porque foste ambiciosa!!!
*Versão troikista da fábula de Esopo.