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Este militante anti-cinzentista adverte que o blogue poderá conter textos ou imagens socialmente chocantes, pelo que a sua execução incomodará algumas mentalidades mais conservadoras ou sensíveis, não pretendendo pactuar com o padronizado, correndo o risco de se tornar de difícil assimilação e aceitação para alguns leitores! Se isso ocorrer, então estará a alcançar os objectivos pretendidos, agitando consciências acomodadas, automatizadas, padronizadas, politicamente correctas, adormecidas... ou espartilhadas por fórmulas e preconceitos. Embora parte dos seus artigos se possam "condimentar" com alguma "gíria", não confundirá "liberdade de expressão" com libertinagem de expressão, considerando que "a nossa liberdade termina onde começa a liberdade dos outros"(K.Marx). Apresentará o conteúdo dos seus posts de modo satírico, irónico, sarcástico, dinâmico, algo corrosivo, ou profundo e reflexivo, pausado, daí o insistente uso de reticências, para que no termo das suas incursões, os ciberleitores olhem o mundo de uma maneira um pouco diferente... e tendam a "deixá-lo um bocadinho melhor do que o encontraram" (B.Powell). Na coluna à esquerda, o ciberleitor encontrará uma lista de interessantes sítios a consultar, abrangendo distintas correntes político-partidárias ou sociais, que não significará a conotação ou a "rotulagem" do Cidadão abt com alguma dessas correntes... mas tão só a abertura e o consequente o enriquecimento resultantes da análise aos diferentes ideais e correntes de opinião, porquanto os mesmos abordam temas pertinentes, actuais, válidos e úteis, dando especial primazia aos "nossos" blogues autóctones... Uma acutilância aqui, uma ironia ali, uma dica do além... Assim se vai construindo este blogue... Ligue o som e... Boas leituras.

sexta-feira, 29 de julho de 2011

O CROCODILO IV



O CROCODILO IV
Quarto episódio


Sacudindo a cabeça de cabra presa pelas mandíbulas, aquele colosso parecia divertir-se à brava!
Ora submergindo, ora emergindo das profundezas, o enorme crocodilo rodopiava sobre si à tona de água! O sangue escarlate tisnava a área envolvente, dissipando-se progressivamente pelo delta do rio.
O rebentamento da ondulação trazia coágulos da sangria que se depositavam nas rochas!
Cá o Cidadão abt ficou estarrecido perante tanta crueldade animalesca!
Aquilo, de facto era uma atrocidade!
De súbito o sáurio estacou, flutuando sobre as águas... só as patas chapinhavam pequenos remoinhos...
O olho direito e amarelado do réptil havia fitado cá os do Cidadão!
O enorme crocodilo apercebera-se que não estava só!
De súbito, com impulsos da cauda mudou a trajectória precisamente cá na direcção, até metade do animal se descobrir sobre as escarpas fluviais!
O colosso escamado descerrou a enorme bocarra de dentes afiados, desvendando a esguia glote que obstruía as entranhas!
Emitindo um esgar esquisito, vergastava as águas com a cauda! Aquilo complicara-se!
Cá o Cidadão recuou uns metros e tropeçando num calhau encorajou o bicharoco a sair completamente da água... avançando uns metros nas rochas esgravatadas.
Não!
Não podia ser verdade!
Era inacreditável o que estava a acontecer!
Passara a ser o centro das atenções daquele assassino das profundezas subaquáticas!
Este rapaz recuou mais uns quantos metros até junto ao penico amarelo... pegando-lhe pelas correias... pensou em arrear forte feio com o capacete em cima do focinho da besta!
Impotente, depressa desistiu da idéia!
Se aquilo mal preenchia a carola de um homem, que efeito surtiriam umas simpless capacetadas  infligidas no enorme animal?
Ainda se fosse um capacete integral e de marca... mas nem viseira possuia!
A fiabilidade era reduzida!
Bater ao bicho com um capacete amarelo não lembraria a ninguém!
Desistiu da idéia largando o elmo para o xistoso solo, correndo de imediato em direcção à mochila amarela desbotada com o ursinho Pooh!
O lagarto não ficara quedo, avançando outros tantos metros cá na direcção do rapaz!
Este desgraçado lembrara-se que anteriormente encontrara o capa-grilos perdido no fundo da sacola!
Era isso!
A salvação poderia passar pelo capa-grilos!
Aquilo era um instrumento suíço de precisão!
Um multifunções!
Foi uma complicação do camandro dar com a lâmina maior porque com a atrapalhação de tanta ferramenta, primeiro surgiu a lima, depois... a serrinha maior... o descapsulador...o alicate... a tesoura... a chave de fendas... a lupa... o descarrapatador... a serrinha pequena... o abre-latas... o saca-rolhas... a chave Philips... o corta unhas... a lâmina mais pequena... a chave sextavada... uma data de tralhas soltas que caíram para o chão e no meio da trapalhada... a ambicionada lâmina aguçada dos sete centímetros!!!
A oportunidade seria única!
Quem sabe se depois de morta a besta, lhe poderia tirar a pele para confeccionar uns bons pares de sapatos, um cinto, um colete tipos motard e quiçá, sobrassem retalhos para oferecer uma carteira à Companheira!!
Enfim, daria para uma data de marroquinaria!!!
Vai daí, como a loucura pode ser uma virtude, este desafortunado mandou um pulo como nunca dantes ousara, encavalitando-se no lombo do sáurio!
Enganchou os pés por debaixo da barriga do assassino e enrolando-lhe firmemente o braço esquerdo ao pescoço, cravou sucessivamente a lâmina do multifunções no lado direito do pescoço da besta!
Tunga! Tunga! Tunga! Tunga! Tunga!
Uma, duas, três, quatro, cinco!
Foram quantas vezes a naifa dificilmente se alojara na pele grossa e escamosa e empedernida do sáurio... pondo-o quedo de todo!
Será que cá o Cidadão abt lhe houvera dado cabo do canastro?
Ná!
De súbito, o bicharoco espadeirou a cauda tentando desalojar cá o rapaz, saindo-se gorado de tal intento porque a força do momento era bem superior à vontade de deter o sáurio!!!
Sempre com o Cidadão encavalitado no dorso da besta colossal, essa desatou a rodopiar direitinha às águas da albufeira, vejam bem!
No estertor da corrida foram-lhe desferidos mais sete golpes com o capa-grilos que pouco parece terem-no afectado!
O animal mergulhou nas águas profundas da barragem, sempre com este praça grudado ao dorso!
Houve que suster a respiração...
A pressão da profundidade fazia-se sentir nos tímpanos...
Foram escassos, os segundos que pareceram uma eternidade percorrendo supostas dezenas de metros debaixo das águas geladas da albufeira! Este rapaz abriu os olhos reparando num cada vez mais escuro e imenso azul que se perdia na escuridão das profundezas aquáticas! 
As garras do animal funcionavam como remos de uma canoa imprimindo impulsos sucessivos!
De súbito, o crocodilo subira em direcção à superfície, vislumbrando-se a luminosidade cada vez mais próxima!
Saiu fora de água erguendo-se no espaço com o Cidadão grudado ao dorso, aproveitando para inspirar ar fresco e renovado!
Avistou a Ilha do Lombo invertida, mas nem mais vivalma que o pudesse socorrer daquela situação complicada!
O sáurio mergulhara nas profundezas enquanto este praça bem agarrado, lhe ia tentando cravar o capa-grilos no pescoço...
Ouviu o som cavo de uma pancada!
Abriu os olhos, então apercebendo-se que o réptil batera violentamente com a barriga no leito da albufeira!
Estava tramado!
Se safasse desta, nunca mais na vida se meteria com crocodilos! Ficaria muito melhor em caselas sentado no sofá a ver séries de filmes de terror, comendo pipocas!
Quis o cruel destino que assim não acontecesse!
Naqueles momentos a vida correu-lhe à frente, lembrando-se da Coty, da mochila cor-de-rosa com o ursinho Pooh, do computador onde escrevia as cónicas maradas... da gata Cristie... da Bola de Cristal, dos Júniores e até... da Companheira!
Sentia os limites da apnéia, com o crocodilo a manter-se nas profundezas da barragem!
Gaita!
Com a água a entrar-lhe pelas narinas... começara a perder as forças...
Largara o capa-grilos!
Um frio invadira os pulmões, dando a sensação que estava saindo vencido naquela luta desigual entre o homem e a fera!
Bolhas de ar saídas da boca misturavam-se com a água manchada de sangue!
O animal mantinha-se no fundo do lago...
Com a mente conturbada e de punho direito cerrado, este praça desatou aos murros na cabeça da medonha fera...
O bicharoco virou-se, atingindo este desafortunado com uma chicotada fatal da cauda escamada...
Acabara de soltar o monstro marinho...
Esgotavam-se as forças necessárias para regressar à superfície!
O animal abriu a enorme bocarra cravando violentamente os dentes num braço deste desgraçado... sacudindo para um e outro lado!
Voltou a abocanhar não se recorda quantas vezes, sem que sentisse alguma dor... aquilo tinha sido tão de repente... o sangue esvanecia-se pelas profundezas....
-Aaahhhh!
-Aaaaaaaaah!!!

-piiiiiiiiiiiii...piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... piiii... piiiiiiiiii!!! piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii...

O Cidadão abt acordara com o som distante de uma buzina!
Aquilo seria um aparelho de monitorização e suporte de vida?!
Alguém o salvara?
Em aflição ergueu-se bruscamente do chão, espetando uma cabeçada no rebordo da mesa de cimento!!!

-Eiiia! Que dor de cabeça... Virgem Santíssima!

Doía-lhe o punho da mão direita, apresentando uma vermelhidão nunca dantes vista!
Confuso, olhou em volta!
Estaria junto às águas da praia?
Como teria ido ali parar?
-Ah!
Encontrava-se ao fundo do povoado da Cabeça Ruiva!
O tempo passara rápido...
Enquanto os passarinhos cantarolavam nas árvores próximas, o astro-rei despontava por detrás da encosta na direcção das Fontes!
Era dia!
Que pesadelo, mon Dieu!!!
Fôra de um pesadelo do catano, que nem vos diz, nem vos conta!!!

-piiiiiiiiiiiii...piiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... piiii... piiiiiiiiii!!!

Devia ser a carrinha do pão lá no alto da aldeia da Cabeça Ruiva...
 Houve que levantar... dobrar o cobertor... arrumar a mochila... colocar o capacete... em suma, era o tempo de emalar a troxa e zarpar, com uma impressão do carago à luminosidade do dia!
Montar a Coty e dar ao pedal do arranque quanto antes...
Um, dois, três, quatro... cinco impulsos...
-Nada!
Um, dois, três, quatro... cinco, seis... sete... oito impulsos...
Nada! Niente! Nicles! Népias!!!!

-Raios partissem a p***  da mota!!!!

Este rapaz deu-se conta que falara sozinho... o que não seria bom prenúncio para a reputação mental de um indivíduo...
Um, dois, três, quatro...
Um, dois, três, quatro... cinco... seis...
 -Ah!
A torneira da gasosa estava fechada!!!
O material tem sempre razão!
Agora sim!
Pegara ao primeiro impulso!
Olha!
No dia anterior nem reparara nesta placa!
Com o cobertor dobrado sobre o depósito de combustível foi subindo a rampa íngreme até alcançar a tasquinha onde jantara na noite anterior... desligou o motor... por aquilo ser inclinado, fora mais fácil colocar a máquina no descanso central...
Entrou na tasca escura, reparando num quadro em formato A3 exposto na parede do lado esquerdo, com a imagem de Albert Einstein... que parecera não ter lá encontrado na noite anterior...
Hum... ali havia coisa... um mistério... aquelas gentes não eram de ciências...
Desconfiado, cá o Cidadão abt indagou o taberneiro...

-Bom dia... desculpe...a impertinência... aquele quadro é uma gravura... ou será uma pintura a óleo?

-Olá, desde onte, senhore! Aquilo nã é um quadro, senhore! Aquilo é um espelho, senhore...

Este praça só agora reparara no cabelo desgrenhado e nas enormes olheiras com que se apresentara na tasca...
Bolas! Que aspecto!
Não havia pente... o penico amarelo seria capaz de resolver o problema... pensou em voltar a assentá-lo na mona mas aprendera desde pequeno que debaixo de tecto, um homem se deve descobrir... o dia começara bem...

-O que tem para mata-bicho?

-O quê!  O senhore deu cabo do animale?

-Não!!!... Na minha terra, “mata-bicho” é o pequeno almoço! Irra!

-Ah... Pois... Tenho aqui umas carcaças acabadinhas de chegar... ainda estão quentes e tudo...

-Tem presunto?!

Nã senhore!

-Fiambre?

-Nã senhore!

-Queijo?

-Um naco...

-Pode ser...

-E para bebere?

-Sumo de laranja...

-Nã tenho, nã senhore...

-Leite quente?

-Também nã senhore!


Farto de ser contrariado... farto, farto, farto!

-Nã senhor, nã senhor, nã senhor!!! Afinal... o que há nesta casa?!

-Vinho lambrusco e caféi!

-Pode ser café...

-Sopas de caféi?

-Pode ser!!! Xiça!!! O que vier á rede é peixe!!

-O senhore hoje está assim um bocado para o mal disposto...

-Tome o cobertor... obrigado...

-O cobertore era-lhe curto?

-Porquê?!

-É que o senhore decerto dormiu com os péis de fora... Bem se nota...

Cá o rapaz visitou a casa da força... regressando cinco minutos depois... entretanto houvera chegado uma senhora que encostara a barrigona ao balcão corrido da tasquinha...
Bom... não seria assim... tão bem parecida com esta moçoila... mas prontos... para o que é, serve!!
Carrancudo de todo, sentou-se à mesinha de madeira coberta por uma toalha branca aos quadradinhos vermelhos, saboreando o naco de queijo comprimido numa carcaça quente e beberricando a escaldante malga guarnecida a côdeas de pão ensopadas em café! 
A fome era negra...
Silêncio... e muita mastigação...
Percebeu-se que o taberneiro fizera uns sinais suspeitos à dama...
Dirigindo-se à mesa onde abancava este esfomeado, ela atirou de rajada...

-É o senhor que anda à cata dum crocodilo?

-NÃO ME FALEM EM CROCODILOS!!!

Aquilo saíra sem querer!

-Desculpe, senhor... Não foi por mal...

A mulher ficou a olhar de soslaio para esta individualidade absorvendo o fundo da tigela com o resto das sopas de café quente...
-Olha lá, mas o hóme é dôdo ó tú estás a mangar comigo?!
Exclamara a empertigada senhora para o taberneiro... de buço eriçado e com os punhos serrados às largas ancas cobertas por um vestido frisado sobrepondo-se aos joelhos...
-Perdoa-me, Firmina... o home apareceu aqui ontem à nôtinha à precura dum crocodilo perdido na albufêra e agora o que é que tú queres!!

-Nã digas que ele era o das camionetas!!!

Foi o diálogo captado entre a mulheraça e o taberneiro... aquela conversa começara a despertar interesse... jurara nunca mais procurar crocodilos, mas... os ímpetos eram poderosos... e aquilo tornara-se num vício do catano!

-O das camionetas? O que é que isso quer dizer?

-É que há muitos anos... para aí uns vinte, houve umas camionetas às cores que traziam uns leões enormes, umas cobras e umas girafas com o pescoço de fora das grades, pararam ali fora e outra seguiu até junto a rio onde um senhor moreno largou uns lagartos para dentro de áuga!

-Ai sim?

-Sim. Uma menina muito loura e bonitinha chorava que se desalmava e gritava para o homem mal-encarado! Ó Gerináááldo!!! Pelo amor de Deus, não faças isso aos bichinos” e o homem lhe respondia... “tem de ser, mulher, cã gente nã tem dinhêro para o sustento dos animais!”

-Era a tropa?!!

-Não! Eram do circo!

Respondeu prontamente o taberneiro...
Dããsse!
Cá o Cidadão não acertava uma!!!

-Se foi há vinte anos, os bichos teriam criação, teriam morrido ou se fossem vivos, com a idade avançada teriam a dentição bastante danificada, não constituindo perigo para os veraneantes... nestas circunstâncias seriam óptimos contributos para alargar experiências aos estagiários em estomatologia...ganhariam traquejo num manancial de oitenta dentes a branquear... tratar das raízes, meter pensinho, chumbar...etc... Era obra! 
O problema maior viria do mau hálito que os crocodilos libertariam das entranhas... nada que um bom elixir não atenuasse durante as cirurgias mais complexas...

-O que é que o senhore está para aí a dizere?

Lançou o taberneiro...

-Nada, nada... estava cá a pensar alto...

-O hóme é dôdo! Nã te disse?

Retorquiu a dama... Não se aprendia nada... 
Não era ali que este praça se safaria!

-Diga-me uma coisa, se souber... os lagartos eram quantos?

-Eram dois!

-Quer dizer que foram a nadar pela água abaixo... em direcção à barragem...

-Nã senhor! Subiram!

-Subiram? Subiram para onde?

-Em direcção para cima, senhor! Ali para as bandas de Fernandaires, Dornes, ou assim!


No final da manja, pagou a conta... 
Desistir era dos fracos... o longo dia, prometia... havia que rumar mais para montante a ver se dava com o raça do crocodilo... talvez em Dornes fosse um excelente local de busca...
Cá o Cidadão pensou em fretar um Kamov...
Metia a tralha e a Coty lá dentro e... era um ver se te avias até alcançar Dornes...
Ná... o tempo que o aparelho demoraria a descolar do heliporto, aterrar para o embarque cá do freguês... levantar novamente e fazer a aproximação a Dornes, demoraria mais do que lá ir ter, a cavalo na Famel...
Alças da mochila às costas, tirar a motoreta do descanso, colocá-la em marcha e desaparecer ao cimo da rampa, foi um ver se te avias, deixando o taberneiro e a senhora comovidos com a despedida... e envoltos num rasto de fumo... o que era aquilo?
Ah!
Um furgão branco cruzava-se na estrada estreita... reduziu e parou!

-Aiiie sinhõree...cômpri qualquer coisinhããn?

Poças!
Era novamente o casal de pescadores!!!

-Não quero nada!

-Sinhôriii Compri calquer coisitããn! Uma camisolitããn ?!

-Aíiie dêxa-lú... cú hóme é um garganêêêruuun???!!

Rematava a passageira com o bebé ao colo...

-Não quero, não quero, não quero e... não quero!

Quase sacando um cavalinho, este corajoso arrancou novamente pela ladeira acima dirigindo-se ao Carvalhal e apanhando a estrada que liga a Vila de Rei... ali sim!
A Coty mostrara o que valia, atingindo velocidades tão vertiginosas que até o alcatrão se via esbatido!
Às páginas tantas, deu com um sinal laranja onde se lia... “Teste travões agora”!
Estes tipos eram doidos!
...Para que serviria o alfabeto Braille cravado no sinal?!
Se cá o rapaz testasse os dois travões, amandaria um tralho do camandro!!!
Experimentar o travão de trás... seria o bastante! 
Os pneus custavam uns cobres jeitosos... para se testarem travões a torto e a direito!...

-iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... iiiiiiiiiiiiiii... iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!

Outra vez...

-iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii... iiiiiiiiiiiiiii... iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!!!!???

""Eia!!!""C'um catano!

A rodinha de trás ia-se passando para a frente da viatura!!!
Aquilo fôra uma enguinada e pêras!!!!
Nunca mais!
É que nunca mais na vida este praça voltaria a obedecer aos sinais de trânsito!!!
Mais a mais, com o alcatrão naquele estado!
Foi embalando na enorme descida com a Coty desengatada... para poupar gasosa... não podia desligar o motor porque lhe explicaram que perdia eficácia no travão e deixaria de ter a direcção assistida. 
Porque atrás de uma grande descida vem uma grande subida e não fosse a embalagem adquirida a cavalo na Coty... cá o Cidadão abt não teria ousado vencer maior distância...
 Na rotunda antes de entrar em Vila de Rei, obedeceu às placas de Ferreira do Zêzere... podia ser que por ali fosse dar com Dornes...
Sempre a descer... uma maravilha!
Inté podia desligar o motor e tudo, mas não queria fazê-lo por causa do tal problema da direcção... diziam que depois ficava rija.
Foi sempre a aviar até chegar a uma ponte enorme que atravessava o rio Zêzere!
As paisagens eram fantásticas!
Parou, apeando-se de seguida...
Deslumbrante, seria pouco... não encontrara os epítetos adequados para explicar aquela cena tão marada!
De acordo com a sinalética que avistou anteriormente...sabia que mais para montante ficaria Fernandaires...
Ouvira dizer que lá havia um parque náutico ou coisa do género, com muitas canoas e assim...
Contemplou a paisagem à esquerda e depois à direita... durante muitos e longos minutos...
Pela água abaixo descia um tronco de árvore... antigamente as pessoas aproveitavam as correntes do rio para transportarem os troncos dos pinheiros cortados nas encostas adjacentes... que eram posteriormente apanhados em Constância, na foz do rio Zêzere com o Tejo e daí... transportados para as serrações que haviam na Praia do Ribatejo.
Partindo do alto daqueles montes... a madeira escorregava até ao rio... por rampas escavadas na encosta, reforçadas em alguns pontos com taludes de madeira, formando valas que se aprofundavam com a passagem dos troncos... eram as zorras...
Se nesses tempos suspeitassem dum crocodilo no Zêzere,... e cada pessoa desse com um tronco a flutuar no rio... desataria a bramar que tinha avistado um sáurio enorme... e como os troncos viajavam aos magotes... dariam em doidos a ver passar hordas de lagartos de todas as espécies, tamanhos e feitios...
Com a construção de rodovias e a evolução tecnológica as zorras foram-se extinguindo, dando espaço a outras que poderemos encontrar à beira de algumas estradas... precisamente com as mesmas funções... outras, somos nós que as apanhamos...
Bah!
Ganda nóia!
Vamos mas é ao que interessa, senão este episódio não termina hoje!
Aquele tronco lá vinha do lado de Fernandaires... rio abaixo... flutuando bem devagar...
Sulcando a superfície da massa azul... levemente... um tronco verde com malhas acastanhadas... como nunca houvera visto...
Um tronco com focinho pontiagudo... e saliências na zona da testa fazendo lembrar olhinhos...
Um tronco com cauda... e quatro patinhas...
Um tronco... que se aproximava da prumada da ponte onde cá o Cidadão abt observava a paisagem...
Aquilo evocava-lhe... deixem cá ver...
Um crocodilo...
Que trauma!
Já via crocodilos por tudo quanto era sítio e em tudo quanto mexia!
Olhando um milhafre que pairava nos ares... parecia que o pássaro seguia o evoluir do tronco... com bastante atenção...
Afinando a vista melhor... já o tronco quase passara por baixo do tabuleiro da ponte....
-???Um crocodilooo!!!
 Aquilo seria mesmo um crocodilo a sério!
Não era um tronco, Senhora Virgem Santíssima!
E agora, o que fazer ali de tão alto?
Saltar da ponte abaixo?
Empoleirou-se nas grades... náá!
Tinha vertigens!
Olhando para a margem esquerda, junto à ponte iniciava-se um caminho de terra batida que descia para jusante do rio!
Era isso!
Este praça saltou para cima da máquina e correndo com os pés pelo chão ganhou a embalagem necessária para largar a mainete da embraiagem fazendo-a pegar que foi um instante!
Toca de rolar pelo estradão abaixo atingindo uma velocidade fenomenal!
Os calhaus iam saltando para todo o lado com o rolamento dos pneus!
Este praça colocou-se de pé sobre os estribos, aliviando a trepidação da Coty vermelha Ferrari, permitindo que voasse baixinho!
Nem em metade dos buracos do caminho as rodas tocavam!
Olhou por umas frestas da vegetação, reparando que conseguia ir ganhando terreno ao sáurio!
Vai Coty! Vai!
Corre! Corre veloz como o vento!
Anda, Coty linda!
Mais depressa!
O penico amarelo insistia em querer saltar da cabeça... ou talvez a cabeça com ele!
Não havia tempo para pensar, nem tempo a perder!
De súbito a Coty ergueu-se suavemente no espaço sideral, com os troncos dos pinheiros ficando rápidamente para trás e a vegetação descendo um pouco mais baixo!
A trepidação parara!!!
Em breves segundos este praça com a mochila cor-de-rosa desbotada agarrada às costas... sentiu-se leve... muito leve...
Ouvira falar que a velocidade proporcionava um gozo muito especial... sentira que levitava... fascinante! O vento fustigando-lhe no rosto... e nada mais se ouvia...
Teria ultrapassado a velocidade do som?
Escassos segundos depois... sentira os costados acravados nuns balseiros e ao lado, a bela Coty que sempre o acompanhara nas desventuras!
Teve bastante sorte com as balsas prontas a amortecer-lhe a queda!!!
Arrgh!
A sorte protege os audazes!!
Eiaaaa!
Os aguçados picos das silvas espetavam-se-lhe na carne dos braços e das peeernas!
Ali deitado... por cada movimento que tentava, mais espinhos se lhe cravavam no corpo... salvaguardando as costas protegidas pela mochila com o ursinho Pooh!
E a camisola negra com os...
...ia-se esfarrapando aos poucos... no peito!
Mal empregada... custara os olhos da cara!
E sair dali?
Acabara de constatar que o molho de balsas engolira cá o rapaz! Só avistava uma nesga de Céu... e pedacinhos de vermelho Ferrari...espreitando... mesmo ao lado...
Aquilo doía prá burro!!!
-Ai!
Nem por pouco que fosse... este praça se poderia movimentar...
Aquelas arranhadelas provoacam ardores e comichões que não se aguentavam. 
Tentara coçar-se... ai... chiça... não dava!
Caraças!! 
Prontos! Por agora chega de crónica!
Se entretanto os ciber’s não apanharam o fio à meada, façam o favor de ler o primeiro, o segundo e o terceiro epísódios de "O Cidadão abt em busca do crocodilo perdido", porque aquilo está giro pr’a caramba e se quiserem inteirar-se de boas novas, regressem a esta chafarica para se dedicarem ao quinto episódio da infinita saga!!
Ide descansar um bocadito. Vá!
Prontos! Não estão satisfeitos? Levem lá com o Crocodilo V clikando aqui!