UMA OBRA DE ARTE
Em
meados de 1862 foi inaugurado um troço de linha térrea entre Santarém e Abrantes. No dia dois de Dezembro desse ano, uma das
vigas da ponte sobre o Rio Torto
abateu, levando com ela o comboio que transportava diversas carruagens com materiais
e passageiros, nesse dia perecendo catorze pessoas e daí em diante ficando designada
por “Ponte do Catorze”.
Os
anos passaram-se e com eles alguns passageiros foram por ali deixando ficar o escalpo,
pois como a estrutura em ferros cruzados que sustentavam o tabuleiro da linha
férrea era de tal forma estreita, os curiosos que se atreviam em meter os
cornichos fora das janelas das carruagens no momento errado, logo ali
entregavam a cabeça e a alma ao Criador!
Foram
os decapitados do Rio Torto que contribuíram para que a tal ponte requalificasse o nome para “Ponte do Corta Cabeças,”
destituindo-lhe o tal “Ponte do Catorze”.
Foi à época uma belíssima obra de arte!
Vem
isto a propósito de uma outra ponte tão famosa quanto útil na região de
Abrantes, mas que se destina à circulação rodoviária.
É
uma ponte secular, projectada por Hintze Ribeiro, onde sobre ela já circularam biliões
de pessoas e quintiliões de veículos.
Esta
ponte com mais de cem anos de vida e cerca de trezentos metros de extensão foi actualmente submetida a uma
requalificação por parte das Estradas de
Portugal-SA, ora Infraestruturas de Portugal-SA ou por outros escritos, tendo sido sujeita a uma profunda
intervenção na sua estrutura, tão profunda que desde as fundações dos pilares
até às prateleiras, toda ela foi recauchutada, só comparável à intervenção sofrida pela Lili Caneças ou pela Duquesa de Alba, isto para não nos
referirmos à Manuela Moura Guedes,
pois tal mulher poder-se-á ofender com a idéia de ser comparada a uma ponte!
É tudo uma questão de asset management!
Ao
fim de tantas derrapagens na agenda laboral, resultando vencidos mais de dois anos de
trânsito alternado e condicionado a veículos ligeiros, nos finais de Abril
abriu a ponte ao trânsito geral, restando os acabamentos por concluir, no entanto foi alargada a faixa de rodagem comendo uma tira de ambos os passeios no sentido longitudinal, e por sua vez esses passeios levaram um acrescento de aproximadamente oitenta centímetros sobranceiros às águas do Tejo, resultando no alargamento de um metro e sessenta centímetros do tabuleiro no seu todo, sem se ter removido ou somenos alterado a posição das iluminárias, como se fossem vacas sagradas que de origem estavam embutidas no gradeamento e com a deslocação lateral da superfície do passeio acabaram por ficar junto ao lancil...
Compreende-se agora que só um cérebro bem exercitado e dotado de uma visão cirúrgica conseguiria detectar atempadamente esta discrepância nas medidas mas, como um projectista de infraestruturas rodoviárias e obras de arte não será própriamente um alfaiate ou um sapateiro... dá-se-lhe o benefício da dúvida!...
Entende cá o Cidadão abt que doravante se lhe deveria atribuir a toponímia de "Ponte Lili Caneças" porquanto bem a merece.
Pacientemente,
os utilizadores habituaram-se novamente a tirar o cú da cama vinte minutos mais
tarde e a observar a evolução dos retoques finais, empatando um bocado o escoamento do tráfego rodoviário e enveredando pela atitude saudosista sobre os tempos em que a dita cuja sofria de trânsito alternado.
Questionava-se
então se os postes ficariam quedos no mesmo sítio, ou seja, escarrapachados a
meio dos passeios tal como nem nos tempos das carroças sucedeu, ao que qualquer um, por mais lerdo no assunto ou leigo na matéria, logo
deduziria que nessa posição jamais ficariam e seria uma questão de dar tempo ao tempo para que
os operários pudessem laborar a coisa de acordo com os projectistas do Instituto das Estradas de Portugal, ora homens e mulheres bem estudados e peritos em traçados e infraestruturas rodoviárias...
E
não é que os novos postes estão sendo plantados exactamente ao lado dos que vão para abate???
Ora,
foi aqui que cá o Cidadão abt saiu da hibernação, metendo-se ao caminho,
fazendo as tais medições!
A
coisa mais engraçada é que relativamente ao limite da faixa de rodagem dizem os regulamentos que terão de distar um mínimo de cinquenta centímetros e, se aí forem esticar a fita métrica, do limite do lancil aos postes não sobram
os tais de cinquenta centímetros, perigando a circulação de veículos e no que concerne à mobilidade urbana cauciona a
circulação pessoas com e sem cadeiras de rodas, carrinhos de bébé ou objectos análogos, sendo
que a legislação do sector recomenda vivamente que se conserve um metro e vinte para liberdade de movimentos e que na pior das hipóteses esse espaço livre de
circulação se constrinja a noventa centímetros para que nele caibam pelo
menos os ombros dos seguranças dos nossos ministros, mas em fila indiana e sem carrinhos de linhas para a costura dos botões!
Ora, entre os postes e o gradeamento de protecção vão setenta e cinco centímetros bem tchuladinhos, depreendendo-se que o restauro foi feito à dimensão de gente ladina e pequenininha como por exemplo os chineses, uma vez que detendo uma quota parte do mercado eléctrico, estes pouparão no espaço físico e nos leds da iluminação pública, se bem que o XXL deles corresponderá ao nosso S !
Decreto-Lei n.° 123/97 de 22 de Maio
ANEXO I
CAPÍTULO I
Urbanismo
1.6 - O espaço mínimo
entre os postes de suporte dos sistemas de sinalização vertical é de
1,20 m no sentido da
largura do passeio ou via de acesso. As raquetas publicitárias, as cabinas
telefónicas, os postes
de sinalização rodoviária vertical ou outro tipo de mobiliário urbano não
deverão condicionar a
largura mínima livre do passeio de 1,20 m.
Ah
e tal, que só se colocam postes de iluminação num dos passeios ficando o outro
lado livre...
De facto os engenheiros da coisa tiveram o bom senso de mandarem alargar um pouco os passeios a ficarem modos que com 120 centímetros, assim indo ao encontro das normas do redimensionamento para a livre circulação de pessoas...
E os postes senhores! Os postes não estariam contemplados no projecto da obra de requalificação?!
Valha-nos a Virgem Santíssima!!
Tendo os peões as suas regras para cumprir, manda a sua lei que deverão circular pelo passeio da
direita, ou seja, quando o Doutor Viana
vai de Abrantes para o Rossio deverá caminhar pelo lado os
postes e quando o homem pretenda regressar no sentido do Rossio para Abrantes deverá
fazê-lo pelo lado do Portas e Passagens,
que é aquele coiso vermelho desmaiado
que se avista à distância, onde nem as cegonhas querem fazer negócios e nos
mamou uns milhões, fazendo-nos avivar o seguinte pensamento:
A mais, se nos lembrarmos que a Ponte das Lezírias, com uma extensão de doze quilómetros feitos de raiz levou vinte e três meses de construção, desde a primeira pedra até à inauguração, ficamos a perceber qual a nossa quota parte da sociedade que temos firmada com o Estado Português e
nestes aspectos constatamos que aquelas palestras e demais prosápias europeias sobre
a não discriminação das pessoas de mobilidade reduzida e as
acessibilidades ao comum do cidadão não passam de puro snobismo de
circunstância retórica que tão bem se conjuga a um belo palanque de palestras iluminadas
e temperadas a pózinhos de coaching firmadas em mil e um protocolos efémeros cuja papelada mais não serve de que para alimentar a traça e o bicho da madeira.
Olhando
os nóveis postes noutro prisma, ainda assim constatamos que a sua colocação no alinhamento
dos anteriores bem como a duplicidade do número destes não só mantém como aumenta
aquele grau de risco face ao trânsito que se quer rodoviário, uma vez que constituem
um sério obstáculo fixo face aos hipotéticos veículos que eventualmente se
despistem por razões que a razão desconhecerá, uma vez que antes de embaterem
no gradeamento da ponte já levaram com o poste sobre a frente e respectivo capôt, aumentando o grau e as probabilidades de lesões físicas nos ocupantes, como se de um castigo divino se
tratasse.
Além disto os condutores de pesados de mercadorias deverão levar em
conta as extremidades das caixas e da carga transportada especialmente aquando
do cruzamento com veículos de idênticas características, não vá o Diabo tecê-las e deixarem alguma carga
agarrada aos postes de iluminação ou levarem os postes suspensos nos cordames
da mercadoria...
Sobre
esta matéria, prevê a legislação, e mesmo que não a houvesse, dita o bom senso
que as infra-estruturas rodoviárias deverão acautelar a segurança passiva dos
seus utentes, ou seja, promover para que sejam minimizados os danos físicos dos
utentes da via pública, em caso de sinistro.
A
coisa será de fácil solução pois bastaria tão simplesmente que os postes de
iluminação fossem plantados ou mesmo encaixados junto ao gradeamento de
protecção, mas como os senhores engenheiros, os senhores projectistas de demais
expert’s na matéria é que entendem do
assunto, acreditamos que a presente solução no terreno seja a melhor entre as
piores, pois ainda resta a hipótese dos postes serem colocados exactamente em
toda a extensão do eixo da faixa de rodagem, uma vez que pela marca rodoviária
aí inscrita se presume que ninguém deverá invadir a metade esquerda da via.
E
quanto a essa marca rodoviária, temos outra esperteza, diria que saloia...
Em
lado algum a legislação proíbe ultrapassagens nas pontes desde que tenham
largura, extensão e visibilidade para tal.
Ora
pelo que se afigura cá ao Cidadão, esta ponte que liga Abrantes ao Rossio ao Sul do Tejo, pela
via da portagem das Barreiras do Tejo
tem largura, extensão de trezentos metros e visibilidade quanto baste para que
se realizem ultrapassagens...
Por
exemplo, se os condutores levarem com um daqueles papa reformas pela proa, ou
se derem com um velocípede com motor eléctrico cuja velocidade máxima não
atingirá os 26Km/hora, será que se
mantêm à sua retaguarda até ao final da ponte ou, olharão em redor e não
detectando indícios da bófia se meterão à ultrapassagem, pisando uma linha
longitudinal contínua, cometendo a tal contra-ordenação muito grave que também lhes
fará perder pontuação no curriculum?
Por
exemplo, na situação da figura abaixo introduzida, cá O Cidadão, com a estimada Companheira ou
sem ela, iria cumprir rigorosa e escrupulosamente todos os trâmites legais
do código da estrada, assim mostrando que é um indivíduo mui bem comportado.
Mas
há mais!
No
caso das bicicletas, temos o tal pormenor de lhes conservar 1,5 metros de lado a lado,
pelo que também assim os automobilistas se manterão à mesma velocidade da bicla, caso contrário os mais precipitados lhes farão tangentes ou pisarão a tal linha contínua, desde que evidentemente não hajam géninhos pelas cercanias...
Enfim,
foram eles que estudaram nos livros e há por aí quem tenha poderes autárquicos,
alguns administrativos e outros executivos em conformidade aos fregueses,
imiscuindo-se ou demitindo-se das esferas jurídicas conforme os agrados, os agravos, os desagravos e as
circunstâncias politicamente mais correctas...
"Ponte Lili Caneças", uma ponte empalamada, recauchutada e com tudo no sítio!